Bastou o jornal O Globo publicar matéria de página inteira mostrando o cenário devastado na região serrana cinco meses após a enxurrada que provocou 916 mortes e deixou 32 mil desabrigados para os governos federal e estadual anunciarem, no dia seguinte, um conjunto de obras no valor de R$ 678 milhões. Coincidência? As autoridades se pautam pelo fato consumado? Constroem suas agendas a partir das denúncias da mídia?
A urgência em cuidar da recuperação das cidades atingidas não parece pautar as ações do governo estadual e prefeituras. A urgência em atender as famílias desabrigadas esbarra em procedimentos burocráticos. Esta é a desculpa das autoridades. Segundo a secretaria estadual de obras, cinco meses foi o tempo necessário para identificar as áreas onde será possível construir unidades habitacionais.
Sem aluguel social, várias famílias de flagelados começam a retornar para suas casas, retirar o barro e tentar reconstruir a vida do jeito que é possível. No Rio, a situação das comunidades atingidas pelas chuvas de abril de ano passado não é muito diferente. Foram muitas promessas mas onde estão as ações dos governos estadual e municipal?
Numa demonstração de sua real agenda política, o governo do estado voltou atrás na decisão de construir um conjunto habitacional onde ficava o présidio da Frei Caneca – implodido com esta intenção – em função da valorização imobiliária que a região sofreu depois da implantação de UPPs. É para lá que seriam removidas famílias que viviam em áreas de riscos em favelas cariocas que sofreram desmoronamentos.
Um estudo apresentado, semana passada, no C40 – encontro de 40 grandes cidades – só confirmou o que se sabe: as mudanças climáticas vão aumentar o risco de moradores em encostas de favelas. É sábido que a ocupação desordenada em morros potencializou os efeitos do deslizamento avassalador que destruiu localidades na região serrana – chamado pelos geólogos de corrida de lama e detritos.
Durante a conferência, o presidente do Banco Mundial, Robert B. Zoellick, informou que a instituição pode investir até R$ 50 milhões no desenvolvimento de áreas urbanas nas cidades que formam o C40. Mas Zoellick frisou que cada cidade precisa determinar quais são suas necessidades e prioridades.
Verbas de instituições financeiras podem não ser a panaceia para nossos problemas. Mas é desanimador pensar que as necessidades e prioridades vem sendo determinadas ao sabor das catástrofes. Não existe planejamento prévio, nenhum trabalho preventivo e consciente. E muitas vezes o esforço para apagar o incêndio depois não resulta em um milímetro de avanço ou comprometimento social.