O novo imbróglio jurídico criado pela Prefeitura do Rio dá bem a medida da “seriedade” com que essa gestão trata a política urbana e o futuro dos seus moradores. Todas as licenças de construção emitidas
com base na Lei Complementar 104/2009 (PEU das Vargens), aprovada a toque de caixa em 2009, foram suspensas por um decreto do prefeito. Por que será?
Segundo informações divulgadas pela imprensa, o prefeito foi sensibilizado por pesquisadores da PUC-RJ que o apresentaram a uma série de estudos acerca dos impactos que esse PEU traria para os bairros de Vargem Grande, Vargem Pequena, Recreio dos Bandeirantes, parte da Barra da Tijuca e parte de Jacarepaguá. Os números são assustadores. Uma área ambientalmente tão frágil, nos sopés do Parque
Estadual da Pedra Branca, nas barrancas das lagoas de Jacarepaguá e Sernambetiba, estaria fadada, nos próximos poucos anos, a receber uma população que chegaria próximo a um milhão de habitantes. Imagine o
caos da mobilidade! Imagine o caos do saneamento! Imagine o caos ecológico que essa irresponsabilidade causaria!
Pois bem… Sem colocar nem uma vírgula de descrédito nos estudos dos pesquisadores da PUC-RJ, os quais inclusive, já conhecíamos desde 2010, quando foram elaborados, cabe-nos um questionamento não só aos porquês, mas também aos métodos utilizados pela prefeitura do Rio nesse caso.
Em primeiro lugar, essa ação agora, quatro anos após a sanção do projeto de lei é, no mínimo, um atestado de arrogância, falta de transparência e espírito público. O prefeito sancionou um projeto que,
de tão ruim e inconstitucional, não fora encaminhado pelo Poder Executivo (como deve ser um PEU), mas pelas comissões permanentes da Câmara Municipal. Votado em primeira e segunda discussões em menos de
uma semana. Um projeto eivado de inconsistências técnicas e benefícios para uma casta de proprietários de grandes glebas de terra que existem na região, cujo metro quadrado valorizou mais de mil por cento com apenas essa canetada.
Agora, em 2013, além de finalmente ouvir os competentes pesquisadores da PUC, o prefeito deve ter ouvido mais alguma coisa, algum zum zum zum vindo de Brasília, uma vez que o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro já encaminhou um recurso às côrtes supremas (STJ e STF) solicitando a declaração da inconstitucionalidade daquela lei. A ação do MP foi originada por uma denúncia encaminhada por sete vereadores de partidos diferentes, ainda em 2009, entre os quais Eliomar Coelho.
Além das aberrações e exceções várias no processo legislativo que deu origem à norma viciada, faltava uma série de elementos de mérito no tal PEU das Vargens, que a prefeitura, à época, se eximiu de assumir qualquer responsabilidade.
Além disso, há que se considerar a iminente implosão do mercado imobiliário de compra e venda no Rio de Janeiro, devido à super oferta de imóveis novos para uma demanda solvável que não tem a mesma
elasticidade que o apetite dos mecenas do atual alcaide. Em que pese levar em conta a sanha dos capitalistas globais com o leilão de Libra, e a enormidade de recursos que entrarão na nossa economia em breve, esse fenômeno ainda deve levar alguns anos para se consolidar. A “fornada” de milhares de unidades residenciais e comerciais que estão para serem lançadas no mercado do Rio, antes mesmo da última medalha ser entregue a algum atleta olímpico, deve levar a um desaquecimento
do mercado de imóveis novos, nos próximos dois ou três anos.
Mas o que mais nos espanta é que a manobra para evitar o caos acaba saindo pior que a encomenda. Além de ter chancelado uma Lei absurdamente inconstitucional, o prefeito, para corrigir o rumo, adota uma medida também inconstitucional! O Decreto 37.958/2013 criou a Áreade Especial Interesse Ambiental dos bairros de Vargem Grande, VargemPequena, Camorim e parte dos bairros do Recreio dos Bandeirantes,
Barra da Tijuca e Jacarepaguá, nas XVI e XXIV Regiões Administrativas.
O detalhe é que, segundo o próprio Plano Diretor de 2011, um “frankenstein” jurídico que foi muito combatido pela sociedade civil organizada ao longo de mais de dez anos, a criação de Áreas de
Especial Interesse são obrigatoriamente por Projeto de Lei. Qual a diferença? Além de ser inconstitucional, criando uma área de especial interesse por decreto, o prefeito resolve, mais uma vez, na base da canetada, sem discussão com a população. Se fosse um Projeto de Lei, ainda que tenhamos em conta a avassaladora maioria de vereadores, teríamos a possibilidade de contribuir com as soluções. Mas o debate, mais uma vez, não está em pauta.
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