Por que votei não ao projeto de revisão do Plano Diretor? Meu voto não significa nenhuma demonstração ou conclusão de que não houve trabalho. Mas, utilizando o velho adágio popular, quero deixar muito claro: pau que nasce torto, vive torto e morre torto.
Desde o inicio deste processo, venho afirmando, que ele está totalmente equivocado. E por que? O Plano Diretor Decenal que tínhamos era de 1992. Dez anos depois, esta cidade precisa de outro Plano Diretor. Já se vão 18 anos, mais uma razão. Mas se é para atender a função à que se propõe, este Plano tem que ser feito a partir de um diagnóstico. É necessário se fazer um levantamento de dados e informações acerca de como a cidade vive atualmente, com a confirmação desses dados e informações em campo, para saber se estes correspondem à realidade, se a teoria corresponde à prática. Só desta forma é possível montar o arcabouço essencial e fundamental que será a base de um Plano Diretor de verdade.
Isso não foi feito. A prova é que fiz diversas anotações a partir da intervenção da presidente da Comissão de Revisão do Plano Diretor, a vereadora Aspásia Camargo, no dia da votação. A parlamentar disse, por exemplo: “Foram incorporados ainda instrumentos do Estatuto das Cidades, ainda que espacialmente mal definidos”. Errado. Se está mal definido, não deve ser considerado.
De fato, o Rio carece de uma cultura de valorizaração do planejamento urbano, elaborar Planos Diretores é uma tarefa típica do Poder Executivo. Sempre falei: não cabe a nós . Não é falta de capacidade e competência dos vereadores, não; é porque os vereadores não têm os recursos necessários e suficientes para elaborar um Plano Diretor.
O texto que temos a nossa disposição assemelhasse a uma colcha de retalho, tantas vezes modificada e alterada. Se é uma colcha de retalhos, não é um Plano Diretor. Isso me faz pensar naquela história: você faz que trabalha e eu faço de conta que pago. Os vereadores achavam que estavam trabalhando e elaborando uma revisão do Plano Diretor. Mas não estavam. Essa é a verdade e isso tem que ser dito.
Existe algo que considero extremamente absurdo. O Rio de Janeiro é uma cidade que pertence a uma região metropolitana de 17 municípios. Nosso Plano Diretor não tem uma palavra sequer voltada para esta região. Isso é inadmissível. É impossível você fazer um Plano Diretor para nossa cidade sem uma interface. Ouvimos sempre a justificativa dos governantes de que a rede de saúde pública do município não comporta o atendimento porque recebe população de outras cidades. Que pega-se o lixo daqui e joga-se em outros municípios. Para se trabalhar um Plano Diretor deve-se levar em consideração a região metropolitana. Sem isso, não se tem Plano Diretor.
A presidente da Comissão afirmou: “A proposta que o Governo encaminhou para nossa discussão é extremamente carente.” Disse também: “São seis critérios de classificação e de organização de planejamento e administração da cidade. Esses seis critérios não se articulam entre si.” E foi além: “O Plano Diretor corre o risco de ser votado e não ser aplicado. Tal ocorreu com o Plano Diretor de 1992 e poderá acontecer com o de 2010, por falta de operacionalidade.”
Precisamos entender desordem urbana como falha institucional do governo, que não deve se limitar apenas a resolver os problemas por um plano estratégico. O verdadeiro Plano Diretor deveria redundar em diálogo, o que não aconteceu. Este Plano não promoveu o dialogo.
Falta uma reflexão profunda sobre os PEUs (Projetos de Estruturação Urbana). Propus uma lei, que não foi aprovada, a fim de regulamentar estes projetos, a fim de organizar e reorganizar a cidade a partir do seu nível micro, que é a unidade espacial de planejamento. Quando fizemos o Plano Diretor em 1992, dividimos a Cidade do Rio de Janeiro em 55 unidades espaciais de planejamento, e a cada unidade espacial de planejamento seria destinado um PEU.
Sabemos perfeitamente para que servem as atuais macrozonas incentivadas, assistidas. Quando você faz macrozonas promove uma requalificação primitiva e perversa, que inclusive engana a todos. No Plano Diretor anterior, a cidade existia em zonas urbanas, zonas de expansão urbana e zonas de restrição urbana. Quer coisa mais simples do que isso?
Sobre os PEUs, eu pergunto: por que tem sido tão difícil aprová-los na Câmara? É porque os PEUs contrariam interesses da incorporação, da indústria da construção civil, da especulação imobiliária. Só de forma impositiva se fará um Projeto de Reestruturação Urbana conforme determina o Estatuto das Cidades, a lei federal. O Poder Executivo não teve condições, nem recursos, nem vontade de fazer a urbanização das Áreas de Especial Interesse Social. Isto não foi integrado ao Plano. Apresentei uma emenda para incorporar essa demanda das comunidades mas não foi aprovada.
O Plano tem falhas graves! Não temos indicadores, não temos um sistema de informações organizado e muito menos a possibilidade de monitorar as metas que desejamos que sejam definidas para harmonização espacial e territorial da nossa cidade. Se não temos isto, não se pode dizer que esta Casa aprovou um Plano Diretor!
Faço graves críticas às políticas setoriais desse plano. Tentamos, inclusive, lançar mão de um emendão, mas a estratégia não deu certo. O Plano Diretor tem que contemplar o reabastecimento territorial dessas políticas setoriais. Deveríamos ter nos concentrado mais no territorial. Muitas vezes os vereadores querem aprimorar as diretrizes, os objetivos, mas, no final, tudo virou uma grande miscelânea!
Muitos bons secretários não fizeram o dever de casa. Eles têm suas políticas setoriais muito bem organizadas, mas não houve o entrosamento Executivo/Legislativo. O que houve foi chave de galão, de cima para baixo. Eles vinham para cá negociar. Nós apresentávamos 50 emendas. Eles aprovavam duas e achavam que tinha havido negociação. Foram apresentados uma série de destaques mas nenhum deles foi aprovado. Quando não houve concordância dos secretários, os destaques foram simplesmente descartados.
Aproveito para citar pesquisa do jornal O Globo: “Os vereadores do Rio estão preparados para legislar sobre o futuro urbanístico da cidade?” Resposta: “Não.” O Legislativo insiste em dar as costas para a sociedade. Mas, a sociedade está auscultando. De processo eleitoral para processo eleitoral, muitos parlamentares já perceberam que perderam apoio. Mesmo em tempos de pouca mobilização política, a população está muito mais atenta e disposta a cobrar a nossa seriedade.
0 Responses to O porquê do meu voto contrário à revisão do Plano Diretor