Robin Lustig para a BBC RADIO 4.
“Berenice Maria das Neves olha com raiva e dor. Ela está ao lado de uma movimentada avenida nos arredores da cidade, ela aponta, furiosamente, para a pilha de escombros.
– Olhe, isso era minha casa – ela diz – Aonde eu morava com meus filhos e netos. Eles vieram e derrubaram tudo. Destruíram tudo o que eu tinha, minha mesa, meu sofa. Até meu armário com minhas roupas dentro.
O infortúnio de Berenice foi morar em uma das favelas que estão sendo demolidas para a viabilizar obras de infraestrutura vinculadas aos megaeventos.
Ela é- ou melhor, ela era – uma da centenas de pessoas vivendo em casas construídas ilegalmente em favelas. Berenice ganha a vida vendendo comida para trabalhadores em canteiros de obras.
Na pequena comunidade onde ela vivia nos últimos oito anos, aproximadamente mil pessoas viram suas casas serem demolidas para abrir espaço para uma nova via que as autoridades dizem ser parte da preparação para que a cidade possa abrigar os Jogos Olimpícos de 2016.
Mês passado, Berenice foi convocada a comparecer na prefeitura da cidade, no Centro, uma hora distante de onde ficava sua casa.
Lá, Berenice foi avisada que sua casa tinha sido condenada e recebeu uma indenização de R$ 8mil reais como compensação. Quando voltou para a comunidade, sua casa já tinha sido demolida.
– O que posso fazer com R$ 8mil? – ela pergunta – Eu preciso, pelo menos, quatro vezes este valor para conseguir comprar uma casa. E foi terrível conseguir receber o cheque na prefeitura porque não sei ler nem escrever.
Tanto o relatório da United National Human Rigths quanto o do grupo Anistia Internacional condenaram a política de remoções que vem atingindo pessoas como Berenice.
Programa de reassentamento
As autoridades no Rio afirmam que pretendem demolir 3 mil casas antes das Olimpíadas e insistem em dizer que estão tratando os moradores de comunidades removidas da forma mais justa possível.
– Nós já reassentamos milhares de pessoas – diz Carlos Nuzman, presidente do COB ( Comitê Olimpíco Brasileiro).
O loteamento em Campo Grande tem 800 novas casas mas nenhuma área de lazer para as crianças.
– Existem alguns problemas mas talvez você tenha ido aos lugares errados para ver o que está acontecendo – disse Nuzmam.
O geográfo Jorge Luis Borges disse que o número real de casas a serem demolidas é muito maior que 3 mil.
Jorge disse que há um processo claro de gentrificação, em prática, onde o pobre está sendo empurrado para áreas distantes para abrir espaço para a crescente classe media que pode pagar caro por empreendimentos luxuosos que estão sendo construídos no lugar das favelas.
Por hora, Berenice está vivendo nas ruínas de outra casa parcialmente demolida perto de onde ficava sua casa. Veja vídeo.
O chão está coberto de água estagnada e ela diz que é constantemente picada por mosquitos. Ela teme pegar dengue, que é transmitida por mosquitos.
Como nação, o Brasil está em franca expansão. A economia brasileira é uma das que mais cresce no mundo e o país se ufana com orgulho porque, nos próximos cinco anos, será sede da Copa do Mundo e das Olimpíadas.
Mas sua infra-estrutura está se deteriorando, razão pela qual existe agora um enorme programa de construção de estradas em curso.
Na periferia
Alguns dos vizinhos de Berenice agora vivem em um conjunto habitacional ainda mais distante do Centro.
Em Campo Grande, uma hora e meia distante do Centro, 800 moradias foram construídas para pessoas cujas casas foram condenadas por estarem no caminho das novas rodovias.
Cleyton Martins, que trabalha em um restaurante, é um deles. Veja vídeo.
Cleyton Martins dissse que a mudança fez a vida ficar muito mais difícil para sua família. Ele se mudou há sete meses com a mãe e a filha e disse que tem sido difícil se habituar a falta de espírito de comunidade no lugar onde vive agora.
– A casa é melhor do que onde eu Morava – ele admite – Mas aqui não tem lojas, não tem lugar para as crianças brincarem e estamos tão longe da cidade.
Cleyton está preocupado como conseguirá atendimento nos hospitais para sua mãe se ela ficar doente. Ele reclama que as autoridades levaram muito tempo para tomar providências sobre o vazamento de esgoto que forma uma piscina entre as casas.
O vereador Eliomar Coelho diz que a forma como as autoridades estão tratando os pobres é criminosa porque elas estão usando as Olimpíadas como pretexto para recuperar a terra e entregar na mão de empreiteiras que obterão grandes lucros.
– Este é um exemplo claro de como o governo trata os pobres – disse Eliomar – Uma grande oportunidade está sendo desperdiçada. Ao invés de melhorar a vida destas pessoas em função do investimentos relacionados aos megaeventos, acabarão em pior situação. É uma grande violação dos direitos humanos.”
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