Há pelo menos 30 anos, a favela da Estradinha, situada na continuação da Ladeira dos Tabajaras, em Botafogo, faz parte da cidade. Está entre as oito comunidades no plano de remoção imediata da prefeitura, sem que tenha ocorrido nenhum deslizamento de terra ou desmoronamento de moradias no local em função das chuvas de abril. O relatório preliminar da assessoria técnica da Defensoria Pública não identificou casas em situação de risco. No entanto, o processo já começou. Cerca de 130 construções já foram demolidas.
O que me causa mais espanto é que a favela da Estradinha foi declarada Área de Especial Interesse Social (AEIS) em lei sancionada pelo atual prefeito em maio de 2009. Muito antes disso, recebeu intervenções da prefeitura, em 1988, a partir de estudos geológico-geotécnicos. Naquela época, foi beneficiada por obras do Favela-Bairro 1 e 2, ao ser incluída na Lei 3122/2000, que declara a área onde está inserida como AEIS, para fins de urbanização e regularização.
Nesta regularização em 88, a prefeitura atestou que o local era seguro para construção, dividiu a área em lotes e cadastrou moradores. Os que não podiam arcar com a compra de material ganharam, da prefeitura, um kit construção. Cada etapa das construções foi devidamente acompanhada por um engenheiro da prefeitura.
Agora, como respaldo para realizar a remoção, a prefeitura se vale de um relatório elaborado pela GEO-RIO condenando o maciço. Os moradores denunciam não ter sido feita nenhuma vistoria, por parte das autoridades, para se verificar as condições atuais do solo. A Secretaria Municipal de Habitação fez o cadastramento das casas para remoção em janeiro, muito antes das fortes chuvas. A comunidade não teve sequer acesso à explicações sobre o porquê da necessidade de mudança.
Os valores de indenização pagos pela prefeitura aos moradores da comunidade superam o valor médio pago em processos similares. Em alguns casos, foi pago R$ 130 mil quando o valor médio de indenização em favela não ultrapassa R$ 50 mil. Pressionados a agilizar este processo de ressarcimento, os moradores que já compareceram à prefeitura tentam dar logo cabo à burocracia imobiliária e receber a prometida indenização. Muitos temem ficar a ver navios ou mesmo ser despejados. Ou, no caso de permanência prolongada na favela, ver serviços como coleta de lixo ou abastecimento de luz e água serem cortados.
O cenário hoje é de destruição. De um total de 180 casas, cujos moradores já foram indenizados pela prefeitura, 130 já foram parcial ou totalmente demolidas. Dentre as casas demolidas, muitas eram moradias espaçosas e bem construídas. As pouco mais de 100 famílias que ainda resistem na favela convivem com o entulho deixado para trás pelos tratores da prefeitura. Até agora, os veementes pedidos da Defensoria Pública, via ofício, solicitando a retirada do lixo ficaram sem resposta. A Secretaria Municipal de Obras e Projetos Viários foi a única a responder e atribuiu a competência a Secretaria Municipal de Ordem Pública. Mas, até a presente data, nada foi providenciado. O resultado é a proliferação de ratos, cobras e outros bichos entre os que ainda não conseguiram indenização para deixar a favela.
Os moradores que ainda estão na Estradinha têm apoio de órgãos ligados à Justiça e aos Direitos Humanos, como a Defensoria Pública. Mesmo os que gostariam de ficar, e não veêm razão para sair e abandonar seus lares, dormem sobressaltados com o temor do despejo e da remoção.
A (triste) história se repete mais uma vez. Com o dinheiro da indenização no bolso, ou o auxílio aluguel para quem é inquilino, os moradores estão se mudando para bairros distantes de seus trabalhos e das escolas de seus filhos, que correm o risco de perder o ano letivo. O dinheiro oferecido não é suficiente para alugar ou comprar um imóvel próximo a favela da Estradinha, onde estas famílias construíram suas vidas.
Se você ainda não viu, vale a pena assistir ao documentário sobre a remoção das favelas da Praia do Pinto e Cantagalo que postei aqui no blog.
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